Cabeça Livre

Crianças não precisam de proteção contra confusão

É quando estamos confusos que melhor exercitamos nosso pensamento.

O mundo está cheio de coisas pequenas, coisas repetitivas, coisas incessantes, que você não percebe. Até que um dia você as percebe e, então, se torna impossível parar de percebê-las. Uma dessas coisas que recentemente não consegui deixar de notar é o medo, expressado por pais e professores em várias situações, de que as crianças possam ficar “confusas” com algo, e o desejo de contornar essa confusão limitando sua exposição ao mundo.

O que há de tão ruim em ficar confuso?

Talvez você tenha ouvido muito isto em debates sobre o casamento gay: as crianças ficarão confusas com o conceito de duas mamães e dois papais. Como vão entender? Você ouve quando alguém quer criar seu filho bilíngue: ele não vai ficar confuso ao ser exposto a dois idiomas ao mesmo tempo?

As crianças podem, sim, ficar muito confusas. Eu sei que muitas vezes eu mesmo, que sou adulto, fico. Mas a pergunta que permanece sem ser feita e sem resposta é esta: o que há de tão ruim na confusão?

O mundo é um lugar confuso. É ridículo fingir que não. É cheio de contradições e absurdos. Como G. K. Chesterton, um dos meus pensadores favoritos, gostava de dizer, o homem em si é um paradoxo.

Existem essencialmente duas maneiras de lidar com o fato de que a vida é mais ou menos incompreensível: tentar não pensar sobre isso, ou aceitar a confusão como uma etapa natural no processo de aprendizagem. A confusão precede o pensamento. Demanda resolução. É quando estamos confusos que melhor exercitamos nosso pensamento para tentar entender o que quer que esteja nos intrigando. Alguém imagina que Newton não se sentiu confuso enquanto lutava com as leis da gravidade, ou que a teoria geral da relatividade não se originou na confusão de Einstein ao tentar entender o universo?

Se você me perguntasse, eu diria que todos nós poderíamos experimentar um pouco mais de confusão, e as crianças principalmente. A criança confusa é forçada a considerar o mundo. A criança que sente certeza em todos os seus pontos de vista pode ignorar qualquer coisa que não esteja de acordo com eles, pois onde começa a certeza, cessa o pensamento. O verdadeiro perigo não é a confusão, mas o excesso de clareza, muita certeza sobre o mundo. São sempre as pessoas realmente confiantes que são as mais perigosas, e isso ocorre porque elas não têm espaço para ouvir outros pontos de vista ou considerar que possam estar erradas. Para citar Chesterton novamente: “A total autoconfiança não é simplesmente um pecado; a total autoconfiança é uma fraqueza.”

Quando não há confusão nos seus pontos de vista, você cai no dogma. Você se torna incapaz de ver o outro lado de um argumento. Tudo se torna completamente preto e branco. É quando estamos confusos que somos forçados a sentar e pensar, tentar entender as coisas. É aí que o progresso é feito. É quando o crescimento acontece.

O progresso que vem da confusão

É bom ter convicções; certamente eu não estou defendendo o niilismo. Mas também é bom ter essas convicções desafiadas continuamente.

Uma distinção precisa ser feita aqui. O tipo de confusão de que estou falando não é aquela que vem de uma ofuscação desnecessária e intencional. Matemática básica é confusa, e isso certamente não é uma virtude. Mas a confusão sobre questões morais e éticas complexas – o que inclui a maioria das coisas na política – é a única forma de progredirmos, não apenas em direção à verdade, mas também em entendermos um ao outro.

No ambiente hiperpolarizado e hiperpolítico do século XXI, aqueles que não se sentem confusos sobre o mundo são também aqueles que são capazes de descartar e demonizar outros pontos de vista como monstruosos. Quando você vê manifestantes agredindo fisicamente uns aos outros, é porque eles estão tão claramente certos em seus pontos de vista que não podem imaginar nenhum desacordo honesto com eles. Pessoalmente, valorizo muito aquele momento de confusão que me faz dizer: “eu não concordo com aquele sujeito, mas talvez ele tenha alguma razão, no final”.

As pessoas não dão crédito suficiente às crianças, porque elas são muito mais capazes e inteligentes do que achamos. Não só não é necessário protegê-las dos aspectos confusos do mundo, como é insensato. Deixe-as decifrar as coisas por conta própria. Deixe-as fazer perguntas, ler livros, procurar professores e tentar, à sua própria maneira, reconciliar os vários paradoxos que sem dúvida encontrarão à medida que envelhecem. Deixe-as aprender desde cedo que todas as respostas da vida não serão fornecidas para elas em um pequeno livro-texto, e que a sabedoria e a compreensão são coisas a serem perseguidas ao longo da vida, não em uma tarde.

Se mais crianças se acostumassem a pensar dessa maneira, em vez de confiar em figuras de autoridade para aliviar a confusão e dar sentido ao mundo para elas, poderíamos encontrar o mundo um pouco mais pensativo e um pouco menos violento. Mas certamente não menos confuso.

Autor: Logan Albright

Logan Albright é o diretor de pesquisa da Free the People. Logan foi o analista de pesquisa sênior da FreedomWorks, e foi responsável pela produção de uma ampla variedade de conteúdo escrito, pesquisa para aparições da equipe na mídia, e roteiros para produção de vídeo. Logan também gerenciou as pesquisas e entrevistas com candidatos ao Congresso usados para endossos pelo FreedomWorks PAC. Ele recebeu seu mestrado em economia pela Universidade do Estado da Georgia em 2011, antes de partir imediatamente para DC para lutar pela liberdade.

Tradutor: Daniel Peterson

Esse texto é uma tradução da matéria originalmente escrita por Logan Albright em 23 de dezembro de 2017 para a Foundation for Economic Education (FEE, “Fundação para Educação Econômica”).

O texto original, em inglês, publicado sob a licença CC BY 4.0, pode ser conferido em:

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