O governador da Califórnia, Gavin Newsom, está tentando prolongar uma chocante tomada de poder ocorrida durante a pandemia. Ele está esticando tanto a lei estadual que merece uma medalha de ouro Olímpica em ginástica.
Com uma das taxas de casos de Covid-19 mais baixas dos Estados Unidos, uma taxa de vacinação de adultos de mais de 70% e tendo reaberto sua economia de forma ampla em 15 de junho, a pandemia está finalmente em declínio no estado da Califórnia. Mas o governador Gavin Newsom ainda se recusa a desistir dos seus “poderes de emergência”.
“A Califórnia programou acabar com a maioria das restrições ao coronavírus em 15 de junho, mas o governador Gavin Newsom não está suspendendo o estado de emergência”, relatou o jornal local KCRA3. “Newsom está segurando os poderes de emergência dados a ele por um tribunal como uma carta na manga ‘no caso de as coisas piorarem’.”
“Ainda estamos em um estado de emergência”, o governador disse. “Essa doença não foi extinta. Não desapareceu, não está tirando folga nos meses de verão”.
A extensão dos poderes de emergência na Califórnia é genuinamente de tirar o fôlego. De acordo com o KCRA3, a declaração de emergência de Newsom permitiu-lhe alocar unilateralmente bilhões em “gastos de emergência” e alterar ou suspender mais de 200 leis e regulamentos estaduais.
Talvez não seja surpreendente que o governador não queira abrir mão de um poder tão vasto e irrestrito. No entanto, com essa mentalidade de “emergência para sempre”, Newsom está esticando tanto a lei estadual que merece uma medalha de ouro Olímpica em ginástica.
Pela lei da Califórnia, o governador pode declarar estado de emergência apenas em “condições de desastre ou de perigo extremo” que sejam tão graves que “provavelmente estejam além do controle dos serviços, pessoal, equipamento e instalações de qualquer único condado, cidade e condado ou cidade.” Além disso, a lei estadual exige que o governador “proclame o término do estado de emergência na data o mais cedo possível que as condições permitam.”
Claro, ao fazer isso, os poderes de emergência de Newsom vão embora. Seus críticos políticos estão reclamando.
“Se Newsom acredita que o estado é seguro o suficiente para reabrir, então é seguro para as pessoas poderem tomar decisões por si mesmas sem suas regras arbitrárias e caprichosas”, disse Scott Wilk, o principal republicano no Senado Estadual da Califórnia. “Acredito que é hora de ele pendurar sua coroa e restaurar nossa democracia.”
Na verdade, qualquer período agudo de emergência verdadeira durante essa pandemia passou há muitos meses. Muitos problemas perduram, sim, mas o coronavírus e o consequente declínio econômico tornaram-se partes administráveis da vida cotidiana — não uma genuína emergência como um furacão ou terremoto.
Mas Newsom está estabelecendo um cronograma para seus poderes de “emergência” que pode permitir que ele os mantenha por anos ou até mesmo pelo resto do seu tempo no cargo. Insistir que o estado de emergência só pode acabar quando o coronavírus for “extinto” ou tiver “desaparecido” dá ao governador licença para se agarrar a seus poderes expandidos basicamente para sempre.
É improvável que tenhamos zero casos de coronavírus no futuro próximo, mas algumas dezenas de infecções em uma população onde quase todas as pessoas vulneráveis foram vacinadas não configuram uma emergência. E é até possível que o coronavírus se torne uma parte sazonal recorrente da vida, como a gripe.
Então, Newsom está estabelecendo padrões que podem permitir que ele nunca “pendure sua coroa”. Esse é um ato inaceitável de autoritarismo que não tem lugar em uma sociedade livre.
“Isso não é um jogo”, concluiu o conselho editorial do Orange County Register. “Os processos deliberativos legislativos e regulatórios que o governador considera um impedimento às ordens necessárias são, na verdade, a proteção dos direitos de todos os californianos contra ações arbitrárias do governo.”
Os críticos estão certos, e todos devemos esperar que a tirânica tomada de poder de Newsom seja interrompida. Mas a conclusão aqui é mais ampla do que qualquer governador, estado ou mesmo o coronavírus. De vez em quando, vemos que “emergências”, tanto reais quanto fabricadas, são usadas como cobertura para aspirantes a tiranos no governo que desejam quebrar as restrições cruciais a seus poderes que nos mantêm livres.
Nota do Cabeça Livre:
Sobre “emergências” que aparecem de vez em quando, leia na sequência:
Friedrich Hayek, economista ganhador do prêmio Nobel, escreveu a famosa frase:
“Emergências” sempre foram o pretexto sobre o qual as salvaguardas da liberdade individual foram corroídas – e, uma vez suspensas, não é difícil para qualquer um que assumiu poderes de emergência ver que a emergência vai persistir.
Portanto, não apenas olhe para o que Newsom está fazendo agora na Califórnia com horror. Lembre-se disso da próxima vez que uma emergência aparecer e seus políticos prometerem que, se você consentir que eles tomem o poder, isso será apenas “temporário”.
Autor: Brad Polumbo
Brad Polumbo (@Brad_Polumbo) é um jornalista libertário-conservador e correspondente político na Foundation for Economic Education.
Nota do Cabeça Livre:
A matéria fala do estado da Califórnia, nos Estados Unidos. Façamos um paralelo aqui com o Brasil.
Os decretos estaduais que definem restrições ao coronavírus se apoiam na Lei Federal nº 13.979 de 2020. Esta, por sua vez, foi vinculada ao Decreto Legislativo nº 6 de 2020, que decretou o estado de calamidade pública decorrente da pandemia de Covid-19. Ambos, Lei Federal e Decreto Legislativo, venceriam em 31 de dezembro de 2020. Mas no dia anterior, 30 de dezembro, o ministro Ricardo Lewandowski, do STF (Supremo Tribunal Federal), julgou a ADI nº 6.625, ajuizada pelo partido político Rede Sustentabilidade, e decidiu prorrogar as medidas sanitárias até 31 de dezembro de 2021 ou até a OMS (Organização Mundial de Saúde) declarar o fim da pandemia, o que ocorrer por último.
No momento, ocorre a CPI da Covid, que visa investigar eventuais abusos de poder cometidos por presidente e/ou governadores durante a pandemia, e 11,52% da população brasileira está completamente imunizada contra o coronavírus, tendo recebido as 2 doses da vacina. A meta do Ministério da Saúde é que toda a população brasileira esteja imunizada até o fim do ano.
Nota do Cabeça Livre:
Esse texto é uma tradução da matéria originalmente escrita por Brad Polumbo em 13 de junho de 2021 para a Foundation for Economic Education (FEE, “Fundação para Educação Econômica”).
O texto original, em inglês, publicado sob a licença CC BY 4.0, pode ser conferido em: