Cabeça Livre

Como os alemães passaram de zombadores a invejosos da resposta descentralizada dos Estados Unidos à pandemia

Crédito da imagem: Flicrk - Partido Popular Europeu \| [CC BY 2.0](https://creativecommons.org/licenses/by/2.0/)

Crédito da imagem: Flicrk - Partido Popular Europeu | CC BY 2.0

Os alemães de repente descobriram admiração pela abordagem “caótica” e descentralizada para a saúde pública adotada nos Estados Unidos.

“Uma potência mundial passando vergonha.”

Foi assim que uma importante revista alemã descreveu no ano passado a abordagem descentralizada dos Estados Unidos para enfrentar a Covid-19. O fato de o governo dos Estados Unidos não ter prescrito uma estratégia nacional de lockdown, mas ter deixado as decisões sobre as restrições para os estados, pareceu confuso e caótico para muitos na Europa.

Um ano depois, a maré mudou e alemães sob ordens de ficar em casa assistiram incrédulos aos EUA começarem a voltar à vida normal com uma velocidade de vacinação quatro vezes maior que a da Alemanha.

O que aconteceu?

Uma abordagem de cima para baixo

Semelhante à lei norte-americana, a lei alemã deixou a responsabilidade de impor ordens de ficar em casa e outras restrições drásticas nas mãos dos estados. Ao contrário dos EUA, no entanto, na Alemanha as restrições foram quase idênticas em todo o país. Uma reunião informal e politicamente poderosa de ministros-presidentes de todos os estados alemães junto com a chanceler Merkel decidiu todas as políticas de lockdowns em todo o país.

Pense nisso como algo semelhante a todos os governadores e o presidente se reunindo e decidindo uma política contra a Covid-19 uniforme para todo o país. Isso é federalismo só no nome. A mídia internacional enalteceu a resposta de Merkel, com o The Washington Post elogiando a Alemanha como “uma das invejadas do mundo ocidental” por sua estratégia para lidar com a Covid-19.

Nos Estados Unidos, no entanto, as restrições em resposta ao coronavírus variaram entre os estados. Alguns “estados vermelhos” (governados por republicanos, políticos de direita) nunca fecharam (South Dakota, por exemplo), e muitos como a Geórgia e a Flórida reabriram cedo. Muitos “estados azuis” (governados por democratas, de esquerda), por outro lado, como Califórnia e Nova York, fecharam por mais tempo e de forma mais severa.

E isso é o federalismo na prática: os governos estaduais avaliaram a situação de forma diferente, alguns viram menos risco na reabertura para seus cidadãos do que outros, alguns podem ter colocado a liberdade e a responsabilidade própria à frente de outras preocupações, ou o simples fato de que os estados são muito diferentes, por exemplo, alguns mais rurais, outros mais urbanos.

Uma abordagem federal única de cima para baixo teria negligenciado tudo isso. E o mais importante da política estadual, cidadãos insatisfeitos podem sempre escolher em último caso votar com os pés e deixar o estado: para um número substancial, de fato foi a gota d’água para se mudar de certos estados azuis como a Califórnia.

O mais severo lockdown de todos os tempos

Embora a Alemanha tenha reaberto eventualmente no verão, fechou novamente apenas algumas semanas antes do Natal, interrompendo as compras habituais de Natal. Ao mesmo tempo, os Estados Unidos já estavam administrando as primeiras doses de vacinas. A nova fase de restrições na Alemanha deveria durar apenas um período temporário de quatro semanas, mas acabou durando quase meio ano. Em meio ao lockdown mais severo de todos os tempos na Alemanha, com restrições como toques de recolher, ultrapassando mesmo aquele dos primeiros dias do surto do corona, os federais pressionaram os governos estaduais a concordar em levá-lo ao próximo nível: durante a Páscoa, por cinco dias tudo fecharia, inclusive supermercados. Apenas em um dos cinco dias os cidadãos poderiam comprar comida por metade do dia. O tiro saiu pela culatra e, depois de reação pública, a decisão foi revertida em menos de 48 horas.

Mas dias depois, quando alguns governos estaduais começaram a brincar com a ideia de “modelos de aberturas”, um experimento de reabrir certas regiões com baixos números de infecção, Merkel ameaçou uma tomada de controle federal da política do corona. Mais de um ano após o início da pandemia, o parlamento alemão aprovou a tomada de poder dos estados e novas ordens de fique em casa impostas pelo governo federal garantiram que nenhum estado poderia se desviar da estratégia nacional.

Enquanto isso, a campanha de vacinação norte-americana avançava a todo vapor e vários estados dos EUA, incluindo Texas e Flórida, haviam voltado à vida normal.

Uma repentina admiração pelos Estados “Caóticos” Unidos

A essa altura, a opinião da Alemanha sobre os Estados Unidos havia mudado radicalmente. Se foi a visão anterior de um caótico “corona-oeste” americano. Em vez disso, muitos alemães começaram a invejar as fotos de locais de vacinação drive-through e norte-americanos voltando à normalidade, algo impensável na Alemanha, com centros de vacinação lentos e excessivamente burocráticos e restrições mais severas que no ano anterior.

Então, o que aprendemos com isso?

Só porque decisões são tomadas por um órgão central do governo, não significa que sejam as decisões certas. A longa fase de lockdowns na Alemanha talvez esteja chegando ao fim agora, mas não parece que ela vai se aproximar do progresso dos Estados Unidos na reabertura e vacinação tão cedo. E pode ter certeza que muitos texanos ou floridianos provavelmente não estão muito interessados ​​em trocar de lugar com um alemão.

Decisões sobre intervenções drásticas na vida cotidiana dos cidadãos comuns são tomadas da melhor maneira possível na escala mais local possível: idealmente no nível individual, ou pelo menos no nível local ou estadual, e não por burocratas federais distantes inventando um planejamento único que (só na teoria) serve para todos.

Autor: Sebastian Thormann

Sebastian Thormann é colaborador do Young Voices e aluno da Universidade de Passau, na Alemanha. Ele também escreveu para o Washington Examiner, The National Interest, CapX e Townhall.com.

Tradutor: Cabeça Livre

Esse texto é uma tradução da matéria originalmente escrita por Sebastian Thormann em 26 de junho de 2021 para a Foundation for Economic Education (FEE, “Fundação para Educação Econômica”).

O texto original, em inglês, publicado sob a licença CC BY 4.0, pode ser conferido em:

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